quarta-feira, 28 de abril de 2010

Adeus em 5 Atos

Ato I

[O coração bate com força contra o peito e o sangue sobe as faces, manchando de vermelho o rosto branco de olhos pintados.]

- Você consegue escutar?

-Escutar o quê?

- A minha felicidade.

- ...

- Eu achei que desse. Está tão alto, tão alto em meus ouvidos...

[O coadjuvante aproxima o rosto do peito da personagem principal; toca com o ouvido a roupa pesada que ela usa e escuta um tum-tum descompassado enquanto sorri].

Ato II

- Que noite mais fria para se comemorar.

- A culpa não é minha. Eu não escolho as datas e não mando no tempo.

- Eu não disse que a culpa era sua.

- ...

- Ta. Mesmo não sendo culpada, não muda o fato da noite estar fria.

- Pelo menos não está chovendo.

- É. Pelo menos isso.

- E nós temos um ao outro.

- É. Um ao outro.

[E os dois personagens enroscam as mãos geladas enquanto continuam caminhando pelas ruas frias da sexta à noite.]

Ato III

- Vocês ficaram bonitos na foto juntos.

- ...

- Vocês estão melhores do que nós dois nessa outra foto.

- Acho que foi culpa de quem bateu a foto.

- Não. Acho que você e ela são um casal mais fotogênico do que eu e você.

- Eu e ela não somos um casal.

- E eu e você?

- Não sei. O que você acha?

- Se nós somos um casal, somos os que são retratados de forma mais estranha que eu já vi...

[ O coadjuvante segura as fotografias nas mãos enquanto a personagem principal passa os braços ao redor da cintura].

Ato IV

[O bar está calmo enquanto os dois personagens estão se encarando.]

- Eu entreguei o ouro ao bandido, não foi?

- Não diria que foi assim.

- Apresentei vocês dois e fiz propaganda de como vocês eram pessoas importantes.

- São essas coisas que acontecem sem motivo; não foi porque você nos apresentou.

- Se vocês não tivessem se conhecido, não teriam se apaixonado. É um pensamento lógico e linear, meu caro.

- Mas amor não segue nenhum raciocínio lógico.

- ...

- O que foi?

- Eu achei que fosse só uma paixão.

- ...

- Você nunca disse que me amava.

- Você queria que eu mentisse?

- Não. Mas eu queria que você me amasse.

- Desculpa.

[ A personagem principal levanta devagar da mesa. O coadjuvante observa sem nenhum movimento enquanto a personagem principal vai embora]

Ato Final

[O sol está se pondo e a personagem principal finge não sentir que a temperatura começa a cair. Há dor em seus rosto – e a platéia quase pode sentir uma certa conformidade nas lágrimas, apesar de tudo.

O vento agita o cabelo dela e a última coisa que a platéia vê é um suspiro de quem sabe que as coisas estão perdidas]

Então, o fim – e as cortinas caem e as luzes se apagam.

sexta-feira, 9 de abril de 2010

April in Paris

Há naquele desconforto extraordinário a sensação de estar no desconhecido. O cheiro, o gosto, o som – tudo saído de uma aberração irreal que não foi planejada e que está sendo executada sem a sua permissão.

E há um nome. Duas sílabas que escorregam pela sua língua e que preenchem o ar ao seu redor de um jeito opressivo.

Não há um pensamento sequer que não seja o agora; a experiência de estar fora do lugar-comum, da situação-comum, das pessoas-comuns: uma mistura de coisas que não deveriam ser e coisas que você gostaria de ter coragem para fazer.

Mas essas coisas continuam. Ali. Deslocada, é isso que você pensa. Mais uma pessoa fora do contexto.

Mas tem o nome que não quer calar. Tem a presença que não quer se desfazer. Tem a noite que não quer acabar.

E única coisa que você consegue realmente concluir é que é uma estrangeira em seu próprio lugar.

domingo, 4 de abril de 2010

I'm a fool, but that's ok


É o sabor da madrugada e o refletir das incongruências que eu encontro em você.
Na sua fala mansa.
Na sua história que me repele.
No seu jeito de olhar.
Naquilo que eu busco de uma forma patética e desmontada; na forma como eu tento não ser mais eu mesma naqueles instantes, naquele lugar estranho tão próximo de pessoas conhecidas.
É o seu cheiro que está impregnado na minha pele agora, e é a marca da sua mão que queima contra a minha.